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segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

FRAGATAS-DE-TRINDADE: A LUTA PARA SALVAR AVE BRASILEIRA QUE NÃO CONSEGUE CONSTRUIR NINHOS EM ILHA DEVASTADA


Elas existem só ali. Na remota ilha de Trindade,a 1,3 mil km da costa do Espírito Santo, as trinta últimas aves da espécie Fregata trinitatis procuram por árvores para se reproduzir.
A ilha também abriga outras espécies de fragata, como a fragata-grande. 
Direito de imagem Getty Images (foto)
Conhecidas como fragatas-de-trindade, essas aves marinhas são endêmicas da ilha. Com apenas 30 indivíduos vivos vivendo na natureza, são consideradas criticamente ameaçadas de extinção.
Habituada à vida no mar, a fragata-de-trindade se alimenta de peixes e é capaz de voar grandes distâncias sem pousar em terra firme. Mas ela não consegue se reproduzir sem árvores para fazer seu ninho.
Enquanto procuram um local ideal sob o sol, as aves são observadas pelos cientistas da UFES (Universidade Federal do Espírito Santo) e do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), que sabem que, infelizmente, elas não vão encontrar árvores por ali.
A ilha não tem nenhum morador fixo, mas as paradas que os homens fizeram em Trindade há centenas de anos foram suficientes para acabar com a vegetação do local.
Ao longo dos séculos, os navegadores que passaram por ali queimaram parte das árvores e deixaram ratos, cabras e porcos - que não têm predadores naturais na região e acabaram se multiplicando, comendo e destruindo o resto da vegetação. A ilha tem 9,2 km².
Espécies invasoras introduzidas por humanos destruíram a vegetação das ilhas, como se vê na Praia do Príncipe, na ilha de Trindade. Direito de imagem ICMBio
A destruição foi tanta, explica a analista ambiental Patrícia Serafini, do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Aves Silvestres, que até o solo se perdeu. Atualmente, a ilha abriga cerca de 130 espécies, entre plantas, peixes, aves, crustáceos e répteis.
Segundo ela, com a destruição da vegetação, as aves terrestres que existiam ali acabaram morrendo por não ter como se alimentar. As espécies terrestres que eram endêmicas à região foram todas extintas.
"As aves marinhas, que se alimentam de peixe, conseguiram sobreviver, mas a falta de árvores ameaça sua reprodução", explica Serafini.
O grupo de pesquisadores da UFES, do ICMBio e de outras oito instituições estuda como recompor a vegetação da ilha, mas isso deve levar anos – se depender apenas disso, até a mata nativa estar recuperada, todas as fragatas já terão morrido sem conseguir produzir descendentes.
Reproduzir os animais em cativeiro não é uma opção.
"Não tem como mantê-las em laboratório, elas não sobrevivem e não conseguem se reproduzir em cativeiro", explica Serafini.
"Ou fazemos a fragata voltar a se reproduzir em seu ambiente natural ou a espécie vai entrar em extinção."
Ninhos artificiais
A última esperança dos pesquisadores é tentar estimular as fragatas a se reproduzirem com a criação de postes que imitam árvores e têm ninhos artificiais.
Alguns dos ninhos terão também aves empalhadas para estimular as fragatas-de-trindade reais a usá-los. Direito de imagem Patrícia Serafini
O projeto, criado pela UFES e o pelo ICMBio com o apoio da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, desenvolveu ninhos especialmente adaptados para as fragatas-de-trindade. Alguns deles têm até réplicas de aves e sons dos bichos se acasalando - a ideia é estimular a reprodução.
Os ninhos artificiais terão a base de metal e uma plataforma onde as aves podem pousar e trazer seus próprios gravetos. Eles também usarão réplicas - aves taxidermizadas - para tentar atraí-las.
"A ideia é que as aves ouçam os sons, se sintam atraídas, cheguem perto para investigar o que está acontecendo e percebam que podem se reproduzir ali, até que tragam elas mesmas seus gravetinhos", explica Serafini.
Os pesquisadores testaram vários protótipos feitos de diferentes materiais até chegar no modelo final, que está sendo testado no Rio Grande do Sul antes de ser levado para Trindade.
"Tivemos que encontrar uma estrutura capaz de sustentar uma plataforma e resistir aos fortíssimos ventos da ilha", afirma a ambientalista.
Os biólogos ainda não sabem se os ninhos cumprirão sua função. Outras iniciativas do tipo já tiveram sucesso no mundo – a bióloga Elizabeth Schreiber fez um trabalho bem-sucedido com ninhos artificiais para outras espécies de fragata no Pacífico – mas o projeto em Trindade é a primeira tentativa de fazer isso no Brasil.
"Precisávamos de uma estratégia rápida. Essa pode ser a última chance dessa espécie", diz Serafini.
Outras espécies, como a noivinha, a fragrata-grande, o atobá-de-pé-vermelho e a petral-de-trindade também serão ajudadas pelo programa.
Recuperar as ilhas
A ideia é manter as espécies vivas enquanto ornitólogos, botânicos e outros cientistas trabalham na recuperação da flora local, com a transposição de mudas para as ilhas.
Os ninhos artificiais estão sendo testados no Rio Grande do Sul antes de serem levados para a ilha de Trindade. Direito de imagem Leandro Bugoni
Segundo Serafini, as cobras foram retiradas da região em 2005, mas outras espécies invasoras ainda são um desafio. Os ratos, por exemplo.
"É preciso analisar o impacto que eles têm, pode ser que estejam comendo as sementes das plantas, por exemplo. Nesse caso teríamos que pensar em como erradicá-los, o que não é uma tarefa fácil", diz a ambientalista.
O processo é lento. "É preciso analisar o que tem que ser feito, onde a vegetação está conseguindo se recompor. Depois é preciso recompor o solo para que flora possa crescer."
Se tudo der certo, o trabalho com as aves vai ajudar nisso: as fezes dos animais no chão da ilha ajudam a adubar.
"Queremos recriar um ciclo positivo, em que as aves ajudem a manter as mudas e as novas árvores permitam que haja mais árvores."
Para uma recuperação total, também é preciso proteger a vida marinha de pesca ilegal ao redor das ilhas - o arquipélago é hoje uma área de proteção ambiental, com a pesca proibida em berçários de animais marinhos.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

TESOURO DE FLORA E FAUNA A 500M DE PROFUNDIDADE


Quando se pensa em Amazônia, o que vem à cabeça é a floresta, considerada como o pulmão verde do planeta. Mas o que poucos sabem é que a aproximadamente 500m de profundidade no oceano, na costa entre o Maranhão e o Amapá, uma enorme extensão de recifes de coral abriga um ecossistema marinho igualmente rico em biodiversidade de fauna e flora. A descoberta foi relatada em artigo publicado no final de abril, por pesquisadores brasileiros, na revista Frontiers in Marine Science.
Nas imagens do fundo do mar, a diversidade de formas de vida (Fotos: Divulgação/Uenf)
O interesse da comunidade científica internacional foi imediato: em apenas dois dias, a publicação bateu o recorde de visualizações e downloads da revista: cerca de 400 mil. Segundo um dos autores da pesquisa, o professor Carlos Eduardo de Rezende, do Laboratório de Ciências Ambientais do Centro de Biociências e Biotecnologia da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf), esses recifes de corais formam uma espécie de corredor submerso, que até onde os pesquisadores puderam analisar, se espalha por cerca 56 mil quilômetros quadrados.
“Mas há indícios de que essa área seja ainda maior e que se estenda até o Caribe. Trata-se de um ecossistema único, que abriga uma grande riqueza da fauna e flora, além de recursos minerais”, afirma Rezende, que é Cientista do Nosso Estado, da FAPERJ. Ele assina o artigo, que recebeu o título Perspectives on the Great Amazon Reef: Extension, Biodiversity, and Threats, ao lado de pesquisadores de diversas instituições brasileiras e do Greenpeace.
Iniciado em 2015, o projeto a princípio contou com uma parceria com as universidades americanas de Washington e da Geórgia. O interesse dos pesquisadores americanos era estudar o fictoplâncton – aqueles pequenos organismos marinhos, que têm o mesmo papel das florestas: fazem fotossíntese e são os responsáveis pela produtividade primária do oceano. Mas os brasileiros resolveram ir além e estudar também os sedimentos de fundo.
Como já havia sido relatada a ocorrência de um parcel (material rochoso) na costa em frente ao Pará e Maranhão, os pesquisadores resolveram percorrer a costa de mar entre Barbados e Belém. “Na ocasião, puderam constatar uma grande extensão de formações calcáreas, os chamados rodolitos, e a presença de espécies que caracterizariam formações coralinas”, conta Rezende.
Embora a amostragem inicial tenha sido pequena, aquele foi um ponto de partida para novos projetos. Terminado o trabalho com os americanos, os brasileiros decidiram partir numa segunda campanha, com um navio da Marinha Brasileira. O projeto resultou no artigo An extensive reef system at the Amazon River mouth, publicado na revista Science Advances. Além da projeção internacional que conquistou, o trabalho chamou a atenção do pessoal do Greenpeace.
“O primeiro artigo foi publicado em 2016, descrevendo a ocorrência desse recife de coral e de algumas espécies. Fizemos essa estimativa de ocorrência inicial, procurando delimitar o banco de coral, mas como tínhamos pouquíssimas informações, sabíamos que precisávamos voltar ao local. O que se tornou possível com uma parceria com o pessoal do Greenpeace, que nos possibilitou um aporte maior de equipamentos e, desse modo, ampliar o trabalho”, afirma Rezende.
Para Carlos Eduardo de Rezende, a exploração de petróleo na região poderá ter consequências danosas para esse ecossistema (Foto: Divulgação/Uenf) 
No início de 2017, a bordo do Esperanza, o navio do Greenpeace, os pesquisadores fizeram uma nova viagem à região, e mais outra entre abril e maio de 2018. “O trabalho com o Greenpeace permitiu reconstruir topograficamente o fundo do oceano e estabelecer as fronteiras do recife de coral ao longo da região. Com o apoio de um submarino, também foi possível filmar, pela primeira vez, o local”, fala o pesquisador.
Apesar da descoberta de toda essa riqueza, a magnitude de toda essa diversidade local pode desaparecer antes mesmo de ser conhecida. A região foi leiloada para a exploração de petróleo, o que coloca em risco os recifes de coral, assim como a fauna e a flora marinha locais. “A questão é que no estudo de impacto ambiental da empresa petrolífera não se menciona a presença desse corredor de recifes de coral. Como o Ministério Público do Amapá entrou com ação civil pública para suspender a licença de exploração, houve uma audiência pública no Congresso Nacional e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) decidiu mandar refazer os estudos ambientais”, afirma o pesquisador.
Como aponta Rezende, esses estudos exigem uma supervisão científica de qualidade não somente em função deste enorme habitat recém-descoberto, mas também por conta dos manguezais que existem naquela região. “Um vazamento prejudicaria milhares de espécies”, alerta. Para Rezende, a expectativa era de que os pesquisadores tivessem um apoio mais efetivo por parte do governo brasileiro. “Embora o projeto tenha uma fantástica repercussão internacional, falta apoio em nosso País”, conclui.

Para mais informações, veja também Frontiers in Marine Science