Como a
vida começou? Talvez não haja uma pergunta mais complexa do que essa. Durante
grande parte da História, quase todos os povos acreditaram, em algum momento,
que a resposta estava ligada a deuses e religião.
A Terra é o único lugar onde encontramos vida até agora |
No entanto, durante o último século cientistas tentaram solucionar esse
mistério e tentaram até mesmo recriar o momento do Gênesis em seus
laboratórios.
Até agora
ninguém foi capaz de conseguir isso, mas muitos avanços foram alcançados. Hoje,
grande parte dos cientistas que estudam a origem da vida está confiante de que
eles estão no caminho certo - e alguns deles têm experimentos para comprovar
suas teorias.
A vida é
velha. Os dinossauros são talvez as criaturas extintas mais famosas, e eles
tiveram sua origem há 250 milhões de anos. No entanto, a vida na Terra começou
muito antes.
Em agosto
de 2016 pesquisadores descobriram micróbios fossilizados há 3.7 bilhões de
anos. A Terra não é muito mais velha do que isso, tendo sido formada há 4.5
bilhões de anos.
Dinossauros viveram
recentemente quando comparamos à idade da Terra
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Se
partirmos do princípio de que a vida teve origem na Terra, então isso deve ter
acontecido entre os bilhões de anos entre a formação do planeta e a preservação
dos fósseis mais antigos já descobertos.
Assim
como podemos limitar um espaço de tempo de quando isso ocorreu, também há
informações para tentarmos adivinhar de que forma a vida apareceu pela primeira
vez.
Desde o
século 19, biólogos sabem que todos os seres vivos são compostos por células.
As células foram descobertas no século 17, mas demorou mais de um século para
que alguém percebesse que elas eram a base de todo tipo de vida.
Esses padrões ondulados poderiam
ser fósseis de 3.7 bilhões de anos
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As primeiras
experiências
Antes dos
anos 1880, a maioria das pessoas acreditava no "vitalismo", um
conceito que defendia a ideia de que todos os seres vivos eram dotados de uma
propriedade mágica que os diferenciava de objetos inanimados.
Mas no
começo dos anos 1880 cientistas descobriram diversas substâncias que pareciam
ser únicas à vida, como a ureia.
A
descoberta, no entanto, ainda era compatível com o vitalismo, já que apenas
seres vivos eram capazes de criar essa substância. Em 1828, porém, o químico
alemão Friedrich Wöhler descobriu uma maneira de criar ureia a partir de
cianato de amônio, substância que não tinha conexão óbvia com seres vivos.
Em 1859
houve o maior avanço científico do século 19: a teoria da evolução, de Charles
Darwin, que explicava como poderíamos ter surgido de um único antepassado em
comum - no entanto, a teoria nada dizia sobre como o primeiro organismo surgiu.
Uma célula completa e viva
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Darwin
especulou, em 1871, sobre o que aconteceria caso uma quantidade pequena de
água, cheia de compostos orgânicos simples, fosse banhada pela luz do sol.
Talvez
alguns desses compostos poderiam fazer combinações para formar uma substância
com características semelhantes à vida, como uma proteína, e poderiam evoluir
para se tornar algo mais complexo.
Era uma
ideia inicial que se tornaria base para a primeira hipótese de como a vida
começou.
Em 1924,
o cientista soviético Alexander Oparin publicou seu livro A Origem da Vida,
no qual argumentava que as moléculas centrais para a vida teriam surgido na
água.
Cinco
anos depois, o biólogo inglês J. B. S. Haldane propôs teorias semelhantes e a
ideia de que a vida surgiu pela primeira vez a partir de uma espécie de
"sopa" com ingredientes orgânicos e químicos ficou conhecida como a
Hipótese Oparin-Haldane.
O cientista soviético
Alexander Oparin, autor do livro 'A Origem da Vida'
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A
hipótese, porém, não contava com nenhuma evidência experimental que a
comprovasse.
Foi só em
1952 que o cientista Stanley Miller deu início ao mais famoso experimento já
feito sobre a origem da vida: ele conectou uma série de frascos de vidro pelos
quais circulavam quatro compostos químicos que estariam presentes no começo da
Terra: água fervendo, gás hidrogênio, amônia e metano.
Na
mistura formada, ele encontrou dois aminoácidos: glicina e alanina. Aminoácidos
são comumente descritos como os blocos fundamentais para se construir a vida.
Stanley
Miller deu início ao mais famoso experimento já feito sobre a origem da vida
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A grande
polarização
No começo
dos anos 50 cientistas começaram a explorar a possibilidade de que a vida teria
sido criada de maneira espontânea e natural no início da Terra.
Nessa
época, muitas moléculas biológicas já eram conhecidas, entre elas o ácido
desoxirribonucleico, ou "DNA".
Além de
carregar nossos genes, o DNA diz às células como fazer proteínas. Esse processo,
no entanto, é extremamente intrincado e o DNA carrega informações tão preciosas
que as células preferem mantê-lo seguro e copiar essas informações para
moléculas curtas de outra substância chamada ácido ribonucleico, ou RNA. O RNA
é semelhante ao DNA, mas em vez de duplo filamento, tem filamento simples.
O mecanismo
dentro das células é imensamente intrincado
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Em 1968 o
químico britânico Leslie Orgel sugeriu que a primeira forma de vida não tinha
proteínas ou DNA. Em vez disso, essa forma de vida era composta quase que
completamente por RNA.
Ao
sugerir que a vida começou com RNA, Orgel propôs que um aspecto crucial da vida
- a sua habilidade de se reproduzir - aparecia antes de qualquer outro aspecto.
Mas há
outras características da vida que são igualmente essenciais. A mais óbvia
delas é o metabolismo: a habilidade de extrair energia do nosso meio e
utilizá-la para nos mantermos vivos. Para muitos biólogos, o metabolismo seria
a característica definitiva e original da vida.
A busca pelo
primeiro replicante
Em 1986 o
cientista Walter Gilbert, da Universidade Harvard, sugeriu que a vida começou
no "Mundo RNA".
Segundo
ele, o primeiro estágio da evolução consistia de "moléculas de RNA
realizando as atividades catalíticas necessárias para se organizarem em uma
sopa de nucleotídeo".
A vida precisa de energia para ficar viva
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No
entanto, nos 30 anos após Gilbert ter proposto sua teoria ainda não há provas
irrefutáveis de que o RNA consiga fazer tudo o que a teoria demanda dele.
Uma
dúvida que se destaca é que se a vida começou com uma molécula de RNA, o RNA
deveria ser capaz de fazer cópias dele mesmo. Mas nenhuma forma de RNA consegue
se auto-replicar. Nem o DNA consegue isso.
A potência
dos prótons
Nós nos
mantemos vivos ao nos alimentarmos. Esse processo é chamado de metabolismo:
primeiro você obtém energia para depois utilizá-la.
Esse
processo é tão essencial que muitos pesquisadores acreditam que ele pode ter
sido a primeira coisa que a vida fez.
Nos anos
1980 o químico Günter Wächtershäuser propôs que os primeiros organismos eram
"drasticamente diferentes de qualquer coisa que nós conhecemos".
Segundo ele, eles não eram feitos de células, não tinham enzimas, DNA ou RNA.
Wächtershäuser
imaginou um ciclo metabólico como um ponto de virada: um processo no qual uma
substância química é convertida em uma série de outras substâncias até que,
eventualmente, a substância original é criada novamente. No processo, o sistema
inteiro absorve energia, que pode ser utilizada para reiniciar o ciclo.
Água vulcânica é quente e rica
em substâncias químicas
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Todos os
outros componentes de organismos modernos, como o DNA, células e cérebro,
teriam vindo depois, construídos com base nesses ciclos químicos.
O
processo de obtenção de energia por organismos também chamou a atenção do
bioquímico Peter Mitchel, que passou sua carreira estudando o que é feito com a
energia recebida de alimentos.
Ele sabia
que todas as células armazenam sua energia na mesma molécula: o trifosfato de
adenosina (ATP). Mitchell queria saber como as células produziam o ATP.
Ele
também sabia que a enzima que produz o ATP fica em uma membrana, então ele
sugeriu que a célula estava bombeando partículas carregadas -
"prótons" - através da membrana, então havia muitos prótons de um
lado e quase nenhum do outro.
Os
prótons tentariam então fluir de volta através da membrana para deixar o número
de prótons equilibrado em cada um dos lados - mas o único lugar pelo qual eles
conseguiam passar era a enzima. O fluxo de prótons passando deu à enzima a
energia necessária para fazer o ATP.
O geólogo Michael Russell
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Mitchell
apresentou sua ideia em 1961 e hoje nós sabemos que o processo identificado por
ele é utilizado por todos os seres vivos. Assim como o DNA, ele é fundamental
para a vida.
Usando
essa descoberta como base, o geólogo Mike Russell seguiu a lógica e propôs que
a vida deve ter sido formada em algum lugar com um gradiente de prótons
natural, algo parecido a um respiradouro hidrotérmico.
Em 2000,
Deborah Kelley, da Universidade de Washington, descobriu os primeiros
respiradouros alcalinos no meio do Oceano Atlântico, onde a crosta terrestre
está sendo dividida e uma crista de montanhas está surgindo no fundo do mar.
Nessa
crista, Kelley descobriu um campo de respiradores hidrotérmicos que ela chamou
de "A Cidade Perdida", que abriga densas comunidades de
microorganismos.
Esses
respiradores deram força à ideia de Russell e ele ficou convencido de que
respiradouros parecidos seriam o local onde a vida começou. Em 2003 ele se
juntou ao biólogo William Martin para tentar dar substância à sua teoria.
Parte da 'Cidade Perdida' no
Atlântico
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Os
respiradouros encontrados por Kelley eram porosos e cada um desses poros
continha substâncias químicas. Combinando esses poros com o gradiente de prótons
natural, esse seria um local ideal para o metabolismo ser formado.
Uma vez
que a vida tivesse acumulado energia química da água, segundo Russell e Martin,
ela começava a criar moléculas como o RNA. Eventualmente, ela teria criado sua
própria membrana e se transformado em uma célula real, escapando das paredes
rochosas e porosas do respiradouro seguindo rumo ao oceano.
Essa
hipótese é considerada uma das principais para a origem da vida.
Como fazer
uma célula
Todos os
seres vivos na Terra são feitos de células. O objetivo de uma célula é manter
no mesmo lugar todas as substâncias essenciais para a vida.
A parede
da célula é tão essencial que muitos pesquisadores argumentam que esta deve ter
sido a primeira característica a ser formada. A teoria tem como seu principal
defensor Pier Luigi Luisi, da Universidade Roma Tre, em Roma, na Itália.
A teoria
de Luisi é simples: como você poderia criar um metabolismo que funciona ou um
RNA auto-replicante sem ter um recipiente para manter todas as moléculas
juntas?
Células se reproduzem ao se
dividirem em duas
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De alguma
maneira, no calor e nas tempestades do início da Terra, alguns materiais devem
ter se juntado em células brutas, ou "protocélulas".
Em 1994,
Luisi sugeriu que as primeiras protocélulas deveriam ter RNA e esse RNA teria
sido capaz de se replicar dentro da protocélula. Jack Szostak, cientista da
Escola de Medicina de Harvard que pesquisa o RNA, apoiou a ideia de Luisi.
Em 2001
os dois argumentaram, em um artigo na revista "Nature", que seria
possível fazer células vivas do zero ao hospedar RNAs replicantes dentro de uma
bolha oleosa.
Eles
começaram a testar a ideia com protocélulas e eventualmente conseguiram fazer
com que elas crescessem.
As primeiras células devem
ter abrigado a química da vida
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A dúvida
agora era se essas protocélulas também poderiam se reproduzir e, em 2009,
Szostak e um aluno conseguiram criar uma protocélula longa o bastante que, sob
pressão, se despedaçava em dezenas de pequenas protocélulas descendentes.
Em 2013,
Szostak e uma aluna conseguiram realizar o que Luisi propôs em 1994: fazer com
que a replicação e a compartimentalização acontecessem quase que simultaneamente.
Esse
feito inspiraria uma nova abordagem unificada para encontrar a origem da vida,
que tenta provar que todas as funções da vida foram criadas ao mesmo tempo.
A grande unificação
John
Sutherland, do Laboratório de Biologia Molecular de Cambridge, no Reino Unido,
apoia a ideia de que todos os componentes da vida teriam sido formados ao mesmo
tempo.
Sutherland
acredita que se conseguir fazer uma mistura de componentes suficientemente
complicada, todos os componentes da vida podem se formar ao mesmo tempo e,
depois, se unirem.
Mas ainda
há um problema que nem Sutherland nem Szostak conseguiram solucionar. O
primeiro organismo vivo deve ter algum tipo de metabolismo, já que desde o
começo a vida precisaria conseguir energia para sobreviver.
"As origens do metabolismo devem estar lá
de alguma maneira", disse Szostak. "A fonte de energia química será a
grande questão agora."
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