O que se
passa em nossa cabeça no momento da morte?
Não se
sabe exatamente e, embora os cientistas tenham alguma ideia, a resposta
continua sendo um grande mistério. Além de difícil solução, tentar respondê-la
pode criar implicações éticas.
No
entanto, uma equipe de cientistas da Universidade Charitée, em Berlim, e também
da Universidade de Cincinnati, nos Estados Unidos, encontraram uma maneira de
realizar um pioneiro estudo sobre a neurobiologia da morte. A pesquisa foi
liderada pelo cientista Jens Dreier.
Pesquisadores de duas universidades
decidiram estudar o que ocorre dentro do cérebro no momento da morte. Direito
de imagem Getty Images
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O título
da pesquisa foi "Despolarização da difusão terminal e silêncio elétrico na
morte do córtex cerebral humano". Para realizá-la, os cientistas
precisaram do consentimento dos parentes de vários pacientes terminais. O
estudo exigia um monitoramento neural considerado invasivo.
Os
pacientes tinham sofrido terríveis acidentes de trânsito, acidentes vasculares
cerebrais ou paradas cardíacas. Ou seja, nesses casos, não havia mais como salvá-los,
segundo os pesquisadores.
Ao
trabalhar com essas pessoas, os cientistas descobriram que os cérebros dos
animais e dos seres humanos morrem de uma maneira parecida. Eles agora dizem
que também existe um exíguo momento em que o funcionamento do cérebro pode ser
restaurado, ao menos de forma hipotética.
O
objetivo do estudo não era apenas observar os últimos momentos de um cérebro,
mas também compreender como seria possível salvar vidas no futuro.
Pesquisa apontou que neurônios 'armazenam'
energia com a esperança de que o corpo volte a funciona. Direito
de imagem Getty Images
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Cérebros de
animais
Grande
parte do que até então se sabia sobre a morte cerebral era produto de
experimentos com animais, realizados no século passado.
Até
então, o que se conhecia era o seguinte:
- O cérebro é privado de oxigênio quando o sistema cardiovascular do corpo para de funcionar.
- Ocorre uma condição conhecida como isquemia cerebral, na qual a falta de componentes químicos leva a uma 'inatividade elétrica completa' no cérebro.
- Acredita-se que o chamado 'silenciamento cerebral' ocorre para que os neurônios conservem sua energia, mas isso acontece em vão, pois a morte total chega antes de uma reabilitação.
- Todos os íons importantes escapam das células cerebrais, já que os suprimentos de adenosina trifosfato, composto que armazena e transporta energia em todo o corpo, estão esgotados.
- A recuperação do tecido torna-se impossível.
"A
lesão total e irreversível dessas células se desenvolve em menos de dez minutos
quando a circulação cessa completamente", explica um dos cientistas no
estudo.
Pesquisadores monitoraram a atividade
cerebral de dez pacientes terminais. Direito
de imagem Getty Images
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Cérebro
humano
A equipe
de pesquisadores queria ter mais detalhes sobre o que acontece com o cérebro
dos humanos, algo que ainda estava cheio de enigmas.
Para
isso, à medida que o paciente terminal piorava, os cientistas monitoraram sua
atividade neurológica usando dezenas de eletrodos.
Em
primeiro lugar, em oito dos dez pacientes, os pesquisadores detectaram o
movimento de células cerebrais que tentavam impedir o inevitável, ou seja, a
morte que já se avizinhava.
De
maneira geral, os neurônios funcionam com íons carregados, o que cria desequilíbrios
elétricos entre eles e seu ambiente - isso permite que pequenos choques, ou
sinais, sejam criados. Para os autores do estudo, a manutenção desse sistema
fica mais difícil quando a morte está chegando.
Para se
alimentar, essas células "bebem" oxigênio e energia química da
corrente sanguínea. Quando o corpo morre e o fluxo de sangue que chega ao
cérebro para, os neurônios - privados de oxigênio - tentam uma de suas últimas
saídas: acumular os recursos que sobraram, dizem os pesquisadores.
Enviar sinais
de um lado para o outro, como normalmente ocorre, acaba se tornando um
desperdício nos últimos momentos da vida. Portanto, os neurônios se
"calam" e, em vez de enviar sinais, usam suas reservas de energia
para manter cargas elétricas internas, esperando o retorno de um fluxo de
sangue que nunca virá.
Mesmo sem circulação sanguínea, o cérebro
continua tentando se recuperar. Direito
de imagem Getty Images
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Esse
fenômeno foi chamado de "depressão não dispersa", pois ele ocorre
simultaneamente em todo o cérebro.
Depois, o
que se segue é a fase da "despolarização da difusão", conhecida como
"tsunami cerebral". Ocorre uma grande liberação de energia térmica,
porque o equilíbrio eletroquímico que mantinha as células vivas entram em
colapso - esse "tsunami" leva à intoxicação e destruição das células.
Todas
essas reações foram observadas pelos cientistas nos pacientes terminais. E à
medida que os níveis de oxigênio caíam, a atividade elétrica também silenciava
em todo o cérebro.
É então
que a morte chega.
No
entanto, o estudo revelou que, no futuro, todo esse processo pode não ser tão
inevitável como é agora.
"A
despolarização expansiva marca o início das mudanças celulares tóxicas que
eventualmente levam à morte, mas não é o ponto chave da morte por si só, pois
essa despolarização é reversível até certo ponto, com a restauração do
suprimento de energia", disse o principal autor do estudo, Jens Dreier, do
Centro de Pesquisas de Acidentes Cardiovasculares da Universidade Charité, de
Berlim.
Os dados
obtidos pelo estudo, publicados pela revista científica Annals of Neurology,
apontam que a ressurreição celular continua sendo possível. Porém, novas
pesquisas devem ser feitas até que isso seja possível.
Como
Dreier assinala, "a morte é um fenômeno complexo" para o qual
"não há respostas fáceis."
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