O
degelo do Ártico tem consequências "enormes" para o planeta, como
condições climáticas extremas, mas também "misteriosas", como a
possível liberação de grandes quantidades de metano, gás causador de efeito
estufa mais nocivo para a atmosfera que o CO2, advertem especialistas.
Na
quarta-feira, a Universidade de Columbia e a organização ambientalista
Greenpeace organizaram duas conferências em separado em Nova York para discutir
as consequências do nível historicamente baixo da superfície de gelo do Ártico,
anunciado pelas autoridades americanas.
As
imagens de satélite mostram que o gelo recuou até 3,4 milhões de quilômetros
quadrados em 16 de setembro, o que parece ser o registro mais baixo do ano,
segundo o Centro Nacional de Neve e Gelo dos Estados Unidos (NSIDC, na sigla em
inglês).
"Entre
1979 e 2012 tivemos uma redução de 13% por década na calota de gelo do Ártico,
uma aceleração com relação aos 6% registrados entre 1979 e 2000. Se a tendência
continuar, não haverá placa de gelo até o fim desta década", disse Wieslaw
Maloswski, da escola de pós-graduação da Marinha americana, em alusão a estes
dados.
Malowski
lembrou, durante a conferência do Greenpeace, que em 1979 a superfície da
calota polar era de 8 milhões de quilômetros quadrados, com uma média de 6,8
milhões nos anos seguintes, demonstrando uma queda de 50%.
Se
estas cifras são piores do que as estimativas, não foram surpresa para a
comunidade científica, informou outro especialista presente no encontro, James
Hansen.
"Estamos
diante de uma emergência planetária", afirmou Hansen, lembrando que o
degelo do Ártico está agravando as consequências do aquecimento global que a
Terra vem registrando por causa dos gases de efeito estufa produzidos pela ação
do homem.
Entre
estas consequências estão condições climáticas extremas em diferentes partes do
mundo, como a seca e a onda de calor registrados este verão nos Estados Unidos
ou o lento mas contínuo aumento do nível dos oceanos que ameaça as zonas
costeiras baixas.
Outro
resultado deste fenômeno é a possível liberação de grandes quantidades de
metano - gás causador de efeito estufa - preso na crosta terrestre debaixo do
gelo eterno da Groenlândia.
"As
implicações são enormes e também misteriosas", concordou Bill McKibben,
co-fundador da ONG 350.org, em alusão a estes cenários.
Para
Peter Schlosser, especialista do Earth Institute da Universidade de Columbia, o
impacto no Ártico é difícil de estabelecer, pois no que diz respeito às
mudanças climáticas, esta região "possivelmente vai responder de forma
mais rápida e severa do que outras partes do planeta".
"As
mudanças do aquecimento global induzido pelo ser humano são cada vez mais
visíveis e se esperam impactos maiores no futuro", afirmou Schlosser.
Recursos
naturais e Rotas marítimas
Por
outro lado, o degelo do Ártico é considerado por muitos uma grande oportunidade
para explorar recursos naturais e utilizar novas rotas marítimas abertas pela
ausência de placas de gelo durante o verão, que encurtarão as distâncias entre
portos da América do Norte, da Europa e da Ásia.
Segundo
as autoridades americanas, no Ártico há reservas petrolíferas da ordem de 90
bilhões de barris, além de gás e minerais, o que já motivou grandes grupos
energéticos como a britânico-holandesa Shell a fazer fortes investimentos na
região.
Para
Kimi Naidoo, diretor executivo da organização Greenpeace International, este
interesse do setor petroleiro e sua enorme influência sobre os governos é uma
das razões da falta de ações concretas para deter o degelo do Ártico.
"Por
que nossos governos não adotam ações? Porque foram capturados pelos mesmos
interesses da indústria energética", afirmou.
"Tenho
uma sensação de “dejà vu”. O mesmo aconteceu com a Aids", acrescentou, em
alusão à lentidão para reagir a esta epidemia e aos milhões de mortes que
causou antes de ser enfrentada corretamente pelos governos.
As
rotas marítimas são uma "tentação", embora os riscos e os custos
sejam muito importantes, advertiu por sua vez Anne Siders, pesquisadora da
Universidade de Columbia.
Entre
estes problemas, Siders enumerou as placas de gelo à deriva, a escassa infraestrutura
em caso de acidente, os custos de projeto dos barcos e os seguros especiais.
Siders
também se referiu às possibilidades que se abrem para a indústria pesqueira e a
ameaça que representa: "a pesca se moverá para o norte, o que significa
que mais peixes serão tirados do seu ecossistema", disse.
Neste
sentido, Caroline Cannon, líder da comunidade Inupiat (nativos nômades) do
Alasca (noroeste dos EUA), que tem 9 filhos e 25 netos, lembrou que seu povo
"depende" da pesca e da caça no Oceano Ártico para sobreviver.
"Estamos
vendo mudanças terríveis. Dá medo pensar no nosso abastecimento de
comida", destacou, em alusão ao futuro do ecossistema na região.
Este
calor fora de época que estamos vivenciando, no Brasil, é proveniente dos gases que provocam o efeito
estufa.
Fonte:
AFP
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