Apesar
das complexidades da vida diária, as regras do nosso universo parecem
reconfortantemente simples: a água de um rio sempre flui montanha abaixo, a
pedra que você joga das margens sempre cai seguindo a mesma curva previsível.
Mas quando
os cientistas se debruçaram para pesquisar sobre os minúsculos blocos
elementares da matéria, toda a certeza se dissipou: eles encontraram o estranho
mundo da mecânica quântica.
A lâmpada
foi responsável pelo nascimento de uma das teorias mais importantes da ciência
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Se
olharmos profundamente tudo que nos cerca, encontramos um universo completamente
diferente do nosso.
Parafraseando
um dos fundadores da mecânica quântica, "o que chamamos de real é formado
por coisas que não podemos considerar reais".
Há cerca
de cem anos, vários dos maiores cientistas da história entraram nesse mundo
estranho e descobriram que nesse reino diminuto os objetos podem estar em dois
lugares ao mesmo tempo e que o destino é ditado pelo acaso - trata-se de uma
dimensão na qual a realidade desafia o senso comum.
E eles
então se depararam com uma possibilidade aterrorizante: a de que tudo que
pensávamos e sabíamos sobre o mundo poderia estar completamente errado.
E a
história de nossa caminhada ao delírio científico começou com um objeto muito
improvável.
Berlim, 1890
Na Alemanha do século 19, várias empresas
de engenharia compraram patente da lâmpada elétrica
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A
Alemanha era um novo país, recentemente unificado e ansioso pela
industrialização.
Várias
empresas de engenharia foram fundadas e foram gastos milhões na compra da
patente europeia da nova invenção de Thomas Edison: a lâmpada elétrica, a
epítome da tecnologia moderna e um grande símbolo otimista de progresso.
As
companhias de engenharia sabiam que poderiam ganhar fortunas se encarregando de
iluminar as ruas do novo império alemão.
O que não
se conseguiu prever então foi que isso iniciaria uma revolução científica.
Ainda que pareça estranho, esse simples objeto foi responsável pelo nascimento
de uma das teorias mais importantes de toda a ciência: a mecânica quântica.
Como?
O foco de
luz apresentava um problema estranho. Os engenheiros sabiam que se os filamentos
esquentavam com a eletricidade, eles brilhavam. Mas não sabiam por quê.
Algo tão
básico como a relação entre a temperatura do filamento e a cor da luz que
produzia era um mistério total, que eles obviamente desejavam resolver.
Com a
ajuda do Estado alemão, os pesquisadores teriam como viabilizar isso. Em 1887,
o governo investiu milhões em um novo instituto de pesquisa técnica em Berlim,
o Physikalisch-Technische Reichsanstalt, ou PTR.
Em 1900,
contrataram um cientista brilhante, ainda que um pouco purista, para
desenvolver pesquisas no local: Max Planck.
O trabalho de Max Planck em mecânica
quântica lhe rendeu o Nobel de Física em 1918
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Ele se
propôs a resolver o problema aparentemente simples da mudança de cor do
filamento com a temperatura.
Para
fazer isso, Planck e sua equipe fizeram um tubo especial que podiam esquentar a
temperaturas muito precisas junto com um dispositivo que media a cor ou a
frequência da luz que produzia.
Na medida
em que a temperatura aumentava, as cores mudavam: a 841°C, a luz era vermelha
alaranjada. A 2000°C, mais brilhante e branca.
Foi então
que comprovaram que, para chegar a essa tonalidade, precisavam de 40
quilowatts.
Mas algo
chamou a atenção: aquela luz era mais que branca, era branca avermelhada, quase
não tinha azul.
Com surgimento das lâmpadas, cientistas se
perguntaram por que a luz emitida não era mais azul, como nas velas
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Por que
era tão difícil chegar ao azul? E mais adiante do azul no espectro, a chamada
luz ultravioleta quase não se produz.
Nem
sequer uma estrela como o Sol, que arde a 5000°C, produz tanta luz ultravioleta
como se pode imaginar diante de sua temperatura.
A catástrofe
e o efeito
Essa
extraordinária falta de sentido deixou os cientistas do final do século 19 tão
perplexos que eles a batizaram com um nome um tanto dramático: a catástrofe
ultravioleta.
Planck
então deu o primeiro passo para resolvê-la: encontrou um vínculo matemático
preciso entre a cor e a luz, sua frequência e sua energia, ainda que não tenha
compreendido a relação entre elas. Mas foi outra estranha anomalia que se
tornou o pulo do gato para a descoberta.
No final
do século 19, os cientistas estavam estudando as então recém-descobertas ondas
de rádio e a maneira como faziam as transmissões.
Para
tanto, construíram aparelhos com discos giratórios que podiam gerar alta
voltagem, o que produzia faíscas entre as duas esferas de metal.
"Por que iluminar esferas feitas de metal faziam com que as
faíscas fossem mais rápidas?", se perguntavam os cientistas
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Ao fazer
isso, eles descobriram algo inesperado relacionado à luz.
Se
dirigiam uma luz poderosa para iluminar as esferas, as faíscas saíam com mais
facilidade. Isso indicava que havia uma conexão misteriosa e inexplicável entre
a luz e a eletricidade.
Mais que
isso, a conexão era com a luz azul e ultravioleta, não com a vermelha.
Esse novo
quebra-cabeça foi batizado de efeito fotoelétrico, que, com a catástrofe
ultravioleta, se converteu em um sério problema para os físicos, pois ninguém
podia resolver as questões mesmo com as técnicas mais avançadas da ciência da
época.
Quantum
Por que a
luz vermelha intensa não conseguia produzir o que a frágil ultravioleta
alcançava em segundos?
Para
resolver o problema, alguém teria que pensar o impensável - e em 1905, alguém
fez exatamente isso.
E esse
alguém foi Albert Einstein. O que ele sugeriu foi revolucionário.
Não foi pela Teoria da Relatividade que
Einstein recebeu o Nobel,
mas "especialmente por sua descoberta da lei do
efeito fotoelétrico"
|
Ele
argumentou que era preciso esquecer que a luz era uma onda e pensá-la como um
fluxo de partículas. O termo que usou para denominar essas partículas de luz
foi "quanto" - do latim quantum, que significa quantidade.
Apesar de
a palavra ser nova, a ideia de que a luz poderia ser um quantum era mais que
excêntrica. E foi justamente seguindo essa linha de raciocínio que Einstein
chegou à sua conclusão lógica que acabou solucionando todos os problemas com a
luz.
Grandes
traços
De acordo
com a proposta de Einstein, cada partícula de luz vermelha tem pouca energia
porque sua frequência é baixa - o contrário do que ocorre com a luz
ultravioleta.
Era por
isso que, no efeito fotoelétrico, a ultravioleta era a que tinha forças para mudar
o que ocorria com a eletricidade.
E era por
isso que na catástrofe ultravioleta a lâmpada não brilhava com luz azul nem
ultravioleta, pois isso requeria muito mais energia.
A luz ultravioleta iluminou a revolução na
física
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"Esse
momento, no começo do século 20, marcou uma revolução genuína, pois demonstrou
que a Física tinha que ser abordada de maneira completamente nova", diz o
historiador da ciência e físico Graham Farmelo.
"Foi
aí que a Física moderna realmente começou."
Um legado
difícil de resolver
Foi assim
que uma simples pergunta - "como funcionam as lâmpadas de luz?" -
levou cientistas até as profundidades do funcionamento escondido da matéria, a
explorar os componentes subatômicos do nosso mundo e a descobrir fenômenos até
então inéditos.
Foi assim
que se abriram as portas da física quântica.
Cientistas
chegaram a propor teorias tão estranhas que um deles, o brilhante Neils Bohr,
chegou a dizer que se alguém não se sentia confuso com a mecânica quântica era
porque não a havia entendido.
E foi
assim que ele e seus colegas que criaram a mecânica quântica - uma teoria
maluca da luz que acolhe a contradição, não importando se é quase impossível de
entender.
Uma ciência
que argumentava coisas tão inusitadas como que não é possível saber onde está
um elétron até que se consiga tirar suas medidas - e não apenas que não se sabe
onde o elétron está, mas que ele está em todas as partes ao mesmo tempo.
Bohr e Einstein discutiram durante anos
sobre a mecânica quântica
|
Mas
Albert Einstein, que abriu as portas deste mundo, pouco depois se sentiu
incomodado com o caminho que ele havia tomado.
Einstein
odiava a ideia de que a natureza, no seu nível mais fundamental, estava
governada pelo acaso. Tampouco gostava da ideia de que o saber tinha um limite.
Estava
convencido de que tinha que haver uma teoria subjacente menor e até chegou a
propô-la.
Durante
anos Einstein e Bohr discutiram apaixonadamente sobre a mecânica quântica
implicar na renúncia da realidade ou não. E morreram deixando essa
interrogação.
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