Os nomes
soam tão diferentes quanto o gosto da maioria desses alimentos seria para o
nosso paladar: araticum, jaracatiá, grumixama, cambuci, licuri.
Mas
apesar da estranheza inicial, esses ingredientes são tipicamente brasileiros. E
correm risco: são parte de um catálogo mundial de alimentos que correm o risco
de extinção.
Grumixama é
um dos alimentos em extinção no Sudeste. Imagem
Alexandre Schneider/Livro 'Misture a Gosto'
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Somente
no Brasil, a lista - chamada de "Arca do Gosto" - tem mais de cem
espécies. A relação é elaborada de forma colaborativa pela organização Slow
Food, criada em 1989 para prevenir o desaparecimento de culturas e tradições
gastronômicas em várias partes do mundo.
Para que
um produto entre na lista dos "ameaçados" há alguns critérios
básicos, como as qualidades gastronômicas especiais, a ligação com a geográfica
local, produção artesanal, ênfase na sustentabilidade e risco de extinção.
Além dos
menos conhecidos, há produtos bem populares da mesa dos brasileiros, como a
jabuticaba, o queijo da Canastra e o pinhão.
Araticum é
um fruto nativo do cerrado. Imagem
Alexandre Schneider/Livro 'Misture a Gosto'
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Para o
biólogo Gleen Makuta, do do Slow Food Brasil, o desaparecimento gradual desses
ingredientes se deve à padronização da alimentação.
"Cerca
de 90% da dieta do mundo todo está pautada em vinte ingredientes, sendo os três
maiores milho, arroz e batata. Então são alimentos que estão muito difundidos,
são produzidos em escala massiva e isso faz com que outros ingredientes percam
o valor econômico e não consigam acessar o mercado", afirma.
"Isso
faz com que todo o conhecimento atrelado a esses ingredientes vá se perdendo. É
uma extinção tanto biológica como cultural."
Apesar do
risco de desaparecimento, todos os ingredientes da lista ainda se encontram
vivos, com potencial produtivo e comercial. Mas poucos chegam à mesa dos
brasileiros.
Para a mesa
Uma das criações dos chefs são as
ostras empanadas com brioche e castanha de baru com creme de juçara defumada
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Justamente
pensando em aproximar esses alimentos da refeição do dia a dia e da mesa dos
brasileiros, a chef de cozinha Claudia Mattos fundou, ao lado de outros chefs,
a Aliança dos Cozinheiros para o Brasil, uma rede que promove e a
biodiversidade agroalimentar e procura trabalhar com ingredientes locais.
"O
Brasil consome e conhece muita coisa de fora - funghi seco e caviar, por
exemplo -, mas não conhece produtos nossos, como cambuci, baru, entre tantos
outros."
O grupo
promove eventos como o Festival Arca do Gosto, que reúne nomes da gastronomia
para elaborar pratos e receitas com esses alimentos.
Em São
Paulo, há uma edição especial somente com produtos do Sudeste, que reúne cerca
de 30 chefs e que vai até novembro.
Claudia
Mattos afirma que, nesses casos, o trabalho é quase didático.
"É
um projeto desafiador, tem que ser didático, explicar o alimento, de onde ele
vem quais os benefícios, aromas, como e se prepara cada um deles porque as
pessoas não tem ideia nem de onde encontrar alguns ingredientes. Os chefs podem
ajudar muito", conta.
Mesmo
para quem já trabalha em cozinha, alguns dos ingredientes são uma novidade.
"É
muito fácil fazer mousse com laranja ou morango porque é conhecido, e o
resultado muito tranquilo, Mas criar um prato com ingredientes que você não
sabe nem como se comportam, se tem que deixar de molho, se tem que assar,
cozinhar, se faz ele doce ou salgado é desafiador e trabalhamos na base da
experimentação", conta.
O Cambuci
passou a ser mais usado no Sudeste há cerca de sete anos. Imagem Alexandre Schneider/Livro 'Misture a Gosto'
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A
intenção dos chefs é estimular o consumo desses produtos ao apresenta-los para
o público geral e incentivar os agricultores.
"Quem
trabalha com esse tipo de alimento preserva também a biodiversidade, os
ingredientes autóctones. Todo trabalho é por isso, nós somos coprodutores, não
adianta todo mundo produzir cebola orgânica porque todo mundo tem. Então é
preciso diversificar", conta.
"Há
pouco tempo, ninguém conhecia cambuci, taioba, ora-pro-nobis pimenta de macaco, e hoje vários
restaurantes já usam esses ingredientes."
Conhece algum ingrediente com risco de extinção
na sua região? Você pode contribuir para a Arca do Gosto - uma comissão vai avaliar sua
indicação.
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