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segunda-feira, 20 de setembro de 2010

O declínio do Y

O grande declínio dos cromossomas sexuais iniciou-se muito antes da evolução de homens, ratos ou mamíferos, logo após a separação entre os nossos antepassados e os das aves, há cerca de 300 milhões de anos.

O Y data de uma época anterior ao desaparecimento dos dinossauros, quando os fetos arbóreos e os répteis simples dominavam a Terra.

O ADN de uma das extremidades do X actual assemelha-se à do seu par Y, sendo a extremidade oposta completamente distinta. Tal como um fecho éclair que se abre, a divergência difundiu-se a partir de uma das extremidades, outrora idênticas. A ruptura foi brusca e os cromossomas masculinos de uma variedade de mamíferos apresentam um padrão salteado, e não gradual, de separação descontínuo relativamente aos cromossomas femininos.

Adicionalmente, vastos blocos de genes inverteram a sua ordem. A primeira combinação ocorreu quando os antepassados das aves e dos mamíferos se separaram. A recombinação mais recente não se deu até ao aparecimento da linhagem hominídea, há algumas dezenas de milhões de anos. Estas convulsões empurraram o SRY para a extremidade do cromossoma Y oposta à do seu homólogo no X.

O Y viveu muitas outras aventuras na sua jornada decadente. O ADN que encerra divide-se em duas partes, algumas secções assemelham-se ao cromossoma X, outras encontram o seu par noutro cromossoma qualquer.
O Y é um clube de genes exclusivo para homens e alguns dos seus membros vêem de muito longe.
Muitos homens são incapazes de produzirem espermatozóides viáveis, uma condição denominada azoospermia. Tal como os seus donos, o Y é frágil e cerca de um homem em cada 100 é infértil devido a uma nova mutação, muitas vezes manifestada como uma pequena quebra no cromossoma. Os genes envolvidos nesta quebra esclarecem-nos acerca da natureza masculina.

As mulheres, possuindo dois cromossomas sexuais idênticos, parecem ser mais simétricas do que os seus companheiros XY. Na realidade, os homens são muito mais simétricos. O Y é de certa forma uma grande sala de espelhos molecular. Nele residem inúmeros palíndromos genéticos, sequências extensas e invertidas de ADN cujas porções repetidas e simétricas retêm uma perfeita homologia ao longo de um vasto número de bases.

«Madam, I'm Adam» é uma frase suficientemente cavalheiresca, mas as suas onze letras são desvalorizadas pelos seus equivalentes moleculares, que podem conter até 3 milhões de unidades de ADN. Desconhece-se a razão da resistência destes segmentos à degradação, mas de alguma forma os machos conseguem mante-los sob controlo. Os principais genes implicados na azoospermia residem precisamente nesta região e quase todos os homens com este problema sofreram uma quebra no mesmo local do cromossoma.

Uma pesquisa informática revela que alguns dos vinte e tal genes do cromossoma Y têm equivalente no seu ancestral X. Outros não. Poucos se assemelham a genes de outros cromossomas, o que não constitui qualquer surpresa, dado que estas estruturas frequentemente se quebram e religam à medida que a evolução decorre. Os migrantes passaram por algumas alterações do estado do mar desde que chegaram ao oceano dos palíndromos, mas retêm grande parte da sua identidade. No entanto, outros passageiros alcançaram o seu refúgio de uma forma muito diferente.

Para sintetizar uma proteína é transcrita uma longa molécula mensageira a partir do ADN. Esta molécula contém secções úteis e vários fragmentos sem informação aparente. Estas porções redundantes são removidas por um conjunto de enzimas especiais e as instruções processadas (agora sem interrupções) são transferidas para as fábricas celulares. Por que razão é a vida tão perdulária, ninguém o sabe.

Um grupo de genes do Y é desprovido desses pedaços supérfluos e existe na forma de versões compactas de um conjunto de membros de uma família dispersos pelo genoma. O seu estado reduzido indica uma história inesperada.
O ADN dos mamíferos encontra-se cercado por vírus. Alguns desviam pedaços de mensagens processadas a caminho das fábricas celulares e insinuam-se juntamente com os seus passageiros num novo local. Muitos genes baseados no Y surgiram desta forma.
O gene, que, uma vez inactivado, causa muitos casos de infertilidade,
é um recém-chegado. Nos lémures, os nossos parentes primatas distantes, encontra-se noutro cromossoma, enquanto nos macacos, nos chimpanzés e em nós próprios a estrutura abriu caminho até ao mestre da masculinidade.

O grande salto deu-se após a cisão entre os ancestrais dos lémures e dos humanos, há 50 milhões de anos, o que, para um evolucionista, é como se fosse anteontem.

O Y, ao que parece, é pragmático e contenta-se em receber qualquer imigrante, independentemente da forma como chega, desde que tenha utilidade, mas está pronto a ignorar aqueles que não a têm. Muitos dos colonizadores são desafortunados. Produzindo proteínas sem grande valor para o macho, acabam por estar sujeitos à degradação.

Este conflito interminável impulsionou o estado masculino para uma escala muito mais alargada do que o próprio cromossoma Y. Este estado é atingido de formas distintas — e, à primeira vista, não relacionadas — em diferentes criaturas. Estas variações sugerem grandes avanços e recuos estratégicos na luta pela masculinidade.

Nas aves, o mundo encontra-se virado do avesso. Os machos são efectivamente XX (com dois grandes elementos determinantes do sexo) e o sexo oposto XY (com um cromossoma grande e um pequeno). O X e o Y aviários não têm paralelo nos humanos, mas apresentam semelhanças com um cromossoma diferente (um antepassado do nosso cromossoma 9), provai de uma origem independente. O sistema das cobras, com machos XX, é semelhante à das aves, mas neste caso outro par de cromossomas tomou o lugar de estandarte da
virilidade.

A mosca-da-fruta adquire o estado masculino de outra forma. Os machos são XY, mas o género da mosca não depende de um gene especial, mas sim de um equilíbrio entre o número de cromossomas X e os restantes. As crias nascidas com apenas um X (sem o Y) são fêmeas, pois o SRY está ausente para as levar pelo caminho alternativo. Contudo, as moscas nessas condições são machos devido a terem metade do número de cromossomas X. As abelhas e as vespas vão mais longe neste conceito de machos como fêmeas diminuídas, já que os primeiros possuem metade do número total de cromossomas.

Determinadas plantas possuem um cromossoma Y, que deve ter evoluído independentemente do nosso. Por fim, certas criaturas recorrem a estratégias que, à primeira vista, desafiam as nossas regras familiares. A identidade não é determinada internamente, mas a partir do mundo exterior.

Na Idade Média, a vida parecia simples: calor do lado direito do útero gerava um rapaz; do lado esquerdo, uma rapariga. Esta visão excêntrica não é totalmente falsa, pois em muitas espécies de peixes e répteis o sexo depende da temperatura de incubação do ovo.
Como frequentemente acontece, os pormenores são ambíguos.
Para os aligatores, o calor gera machos e o frio fêmeas. Já para a maioria das tartarugas é verdadeiro o inverso.
Ovos aquecidos crescem mais rapidamente e geram progenitura de maior porte. Como os machos aligatores formam um harém, compensa qualquer macho ser o maior possível — daí a geração de machos a temperaturas médias. Muitas tartarugas (gerando machos em ninhos mais frios) acasalam pacificamente no oceano, não constituindo qualquer vantagem os machos terem um tamanho maior. No entanto, as fêmeas grandes põem mais ovos.

Para encerrar a questão, as tartarugas-mordedoras (animais de água doce que guerreiam entre si pelas fêmeas) regressam ao padrão dos aligatores, produzindo machos a partir de ovos aquecidos.

O sexo responde a muitas outras pressões exteriores. Em determinada lesma-do-mar de gostos banais um jovem animal afortunado por conhecer uma fêmea torna-se macho, e vice-versa. Uma elevada densidade populacional em certas espécies de insectos leva à geração de machos e os peixes possuem toda uma gama de transições de género dependentes da temperatura emocional, mais do que física, pois uma fêmea muda de sexo quando deixada só num grupo de fêmeas ansiosas por encontrarem um parceiro.

Embora o fim seja alcançado através de uma variedade de meios, a masculinidade em si parece suficientemente simples. Os aligatores, as moscas, os pavões, as lesmas e os peixes não são muito diferentes dos homens na sua paixão partilhada pelo esperma. Por que razão é o seu estado definido de formas tão díspares? O sexo e os machos são mais antigos do que as pessoas ou os aligatores e por isso parece-nos bizarro que os seus mecanismos de controlo se tenham transformado tanto.

Retirado de "A descendência do Homem, Steve Jones. Gradiva

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